A crise econômica dos Estados Unidos



A atual crise do sistema financeiro norte-americano tem as suas raízes muito antes de agosto do ano passado, quando veio a público um grande número de notícias traçando uma perspectiva nada favorável para a economia dos Estados Unidos no curto e médio prazo.
Um dos principais elementos que levaram a atual situação, que já levou a quebra de grandes e importantes bancos (inclusive o tradicional Lehmann Brothers), foi a política de juros baixos do Banco Central dos EUA (o Federal Reserve), que logo após os atentados de 11 de setembro de 2001 enxergou o risco de recessão econômica por lá e manteve a taxa de juros básica da economia em níveis muito baixos por um período considerável – a taxa chegou a ser de apenas 1% ao ano! Com isso, as instituições financeiras, se vendo desestimuladas a aplicar o dinheiro que tinham em caixa, se viram estimuladas a emprestar este dinheiro, criando um cenário de crédito abundante na economia. Tal conjuntura levou a uma anomalia do sistema: passou-se a emprestar dinheiro, em especial para a compra de casas, para pessoas que tinham um histórico de crédito ruim e que não tinham reais condições de adquirir um imóvel financiado. Uma operação de bastante risco. É o chamado crédito sub-prime. Após 2001, portanto, o setor imobiliário viveu um período de forte expansão, gerando empregos e também movimentando outros setores da economia. E, enquanto a economia ia bem e as taxas de juros estavam baixas (vale lembrar que muita gente financiou estes imóveis por meio da taxa baixa vigente, enquanto outros hipotecaram as casas que já tinham para gastar o dinheiro consumindo), as pessoas continuavam se endividando, de acordo com a tendência em momentos de juros decrescentes, haja visto que é justamente essa a intenção de manter uma taxa baixa: que seja desinteressante investir o dinheiro e, portanto, o consumo seja favorecido. Após este período de taxas ridiculamente baixas, enxergou-se um risco de inflação no horizonte, já que o consumo não estava sendo acompanhado por um aumento de produção na mesma medida – e não só isso, já que petróleo e matérias-primas em alta também pressionaram os índices de preço. Assim, o FED começo a subir a taxa de juros, colocando em situação complicada as pessoas que tinham pego dinheiro emprestado em momentos de taxas “mais favoráveis”. E, para se ter uma idéia, em julho do ano passado (2007), a taxa de juros dos EUA já estava em 5,25% ao ano. Naquele momento, as conseqüências daqueles empréstimos subprime que foram feitos, começaram a vir mais fortemente à tona, com um grande número de hipotecas não pagas e que começaram a ser executadas. Diante dessa situação, o Federal Reserve começou a enxergar, além do nível sistêmico de um grave problema no sistema bancário, o risco de a economia caminhar novamente para uma recessão, haja visto que essas pessoas deixariam de consumir (por falta de crédito) e a economia se desaqueceria como um todo. Por isso, as taxas do FED voltaram a recuar a partir de agosto, caindo para 4,75% ao ano em setembro, 4,25% em dezembro, 3% em janeiro de 2008 e 2% em junho deste ano. Enquanto isso, aqui no Brasil, a economia estava em forte expansão – crescendo a taxas de 4 a 4,5% ao ano. No segundo semestre do ano passado, a taxa de juros brasileira (SELIC) foi reduzida de 12% ao ano em junho para 11,75% em julho e 11,25% em setembro, nível que permaneceu até abril deste ano, quando retornou ao patamar de 11,75% ao ano. No extenso período em que o Banco Central brasileiro também reduziu a taxa de juros, observou-se um estímulo ao crédito e aos investimentos no setor produtivo da economia, o que deu mais força ainda ao crescimento econômico observado. A partir de abril, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (COPOM), colegiado que decide a taxa básica de juros da economia brasileira (SELIC), enxergou um risco inflacionário, diante da pressão no preço das matérias-primas e petróleo. Por isso, passou a elevar a taxa de juros interna.

A taxa de câmbio, que estava próxima de R$1,90 em julho de 2007, passou a níveis próximos de R$1,75 em janeiro de 2008 e de R$1,60 em julho de 2008. Cabe notar também que a desvalorização do dólar frente ao real, que já vinha ganhando força, se intensificou a partir de janeiro de 2008, quando o Banco Central norte-americano intensificou também o processo de redução da taxa de juros por lá. A explicação para isso está no fato de que os investidores acabam migrando os recursos de um país para outro quando um deles oferece uma taxa de retorno menor para os investimentos. Neste caso, embora o risco de investir no Brasil seja em tese maior, a diferença entre a taxa de juros local para a dos EUA se tornou maior com a redução realizada por lá (em julho de 2007, a diferença entre as duas taxas era de 6.75%, enquanto em julho de 2008, ela aumentou para 10.75%). Esta mesma desvalorização do dólar pôde ser observada em relação ao EURO, também em parte por conta da taxa de juros em vigor na Zona do EURO, que manteve estável de julho de 2007 até junho de 2008, quando subiu de 4% para 4.25% ao ano. No período, os EUA estavam reduzindo a taxa.

Portanto, pode ser observada uma forte apreciação do EURO em relação ao dólar no mesmo período, justamente porque se tornava mais seguro, rentável e “interessante”, o investimento em EUROS.
Desde agosto de 2007, quando houve o primeiro “solavanco” nos mercados financeiros norte-americanos, o governo dos EUA vem tentando encontrar formas de evitar um contágio dessa crise de crédito para outros setores da economia, o que poderia culminar numa forte recessão. Uma das tentativas para amenizar os efeitos dessa crise foi, por exemplo, um pacote de “devolução de impostos” aos contribuintes por meio de cheques enviados ao correio, proposto pelo governo em janeiro deste ano. "Botar dinheiro no bolso dos consumidores é a melhor maneira de relançar a economia", declarou na época Peter Morici, professor de Economia da Universidade de Maryland. O fato é que essa medida surtiu um pequeno efeito na época, sustentando o crescimento econômico dos EUA no primeiro semestre deste ano, mas não foi suficiente para evitar o agravamento da crise meses depois. O fato é que as raízes do problema, conforme já dito, eram mais profundas e remontam ao enorme montante emprestado às pessoas que não tinha bom histórico de crédito e que, portanto, cedo ou tarde não teriam condições de pagar. No fim do ano passado, o prêmio Nobel de economia, Gary Becker, fez uma avaliação interessante sobre a crise. Na opinião dele, “as más decisões foram dos bancos e das financeiras, alguns deles estão perdendo muito dinheiro, e de algumas pessoas que compraram casas que realmente não podiam pagar". Isso sintetiza de fato a situação criada por estas hipotecas de alto risco. Na verdade, o contágio na economia se deu não só pelo alto montante envolvido, mas também porque muitos dos bancos e financeiras “passaram para frente” estes recebíveis das hipotecas de alto risco, naturalmente por um preço menor do que valiam e de modo a lucrarem ainda mais. E muitos destes títulos foram, mais tarde, utilizados como garantia para novos empréstimos feitos pelos compradores destes títulos, ainda que os primeiros empréstimos não tivessem sido pagos. Desse modo, estes títulos foram utilizados como instrumentos para outras operações financeiras. Desse modo, estes títulos se espalharam pela economia, de uma forma que, se houvesse inadimplência na primeira ponta, ela se espalharia pelos demais envolvidos. E foi o que aconteceu. Por este motivo, muitos desses títulos não valem praticamente nada. Assim, você tem “títulos podres” lastreando uma série de operações, o que também espalha pela economia o prejuízo causado pelo calote das hipotecas. Estima-se que outros bancos, além dos que vieram a público assumir que estão em dificuldades, possam também deter estes títulos e venham a apresentar problemas mais adiante. O fato é que desde meados do ano passado, houve uma retração no crédito imobiliário nos EUA, quando surgiram os primeiros indícios de calote dessas hipotecas de alto risco (sub-prime). E justamente quando existe este calote, cria-se um cenário em que os bancos ficam mais receosos de emprestar dinheiro (também ajudado pela alta nas taxas de juros, conseqüência da situação) e, portanto, você começa a ter problemas de liquidez entre os bancos e no setor financeiro. E tudo isso agravou o problema e fez com que a crise se alastrasse, chegando as proporções hoje observadas. Cabe notar que, diante desse cenário, pôde ser observada uma retração na compra de novas casas a partir de meados de 2007, o que provou uma queda no preço desses imóveis. Tal cenário, aliado a trajetória de alta das taxas de juros nos EUA, também criou um outro problema: muitas pessoas físicas norte-americanas dão o imóvel como garantia para um empréstimo, e com a redução do valor do bem, elas também tem a margem de crédito reduzida, o que fará com que elas tenham menos dinheiro disponível para tomar emprestado e, conseqüentemente, para consumir e isso, cedo ou tarde, vai também impactar no nível de atividade econômica. Portanto, em todos estes casos citados, cria-se uma reação em cadeia, dado o nível de dependência econômica dos diversos setores da economia dos EUA. O fato, consenso atualmente entre os analistas, é que a crise está longe de terminar. Palavras do próprio presidente Bush, no discurso do ultimo dia 24 de setembro: “os Estados Unids estão imersos em uma grave crise financeira". E há, ainda o risco não afastado, de uma recessão. É aguardar para ver.

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